por Maurício Ayer
O Ateliê da Palavra é um projeto de incentivo à leitura por meio de práticas de leitura e escrita criativa de textos poéticos. A edição “Expresso 22•22” aconteceu na forma de oficinas presenciais em alguns espaços culturais e educativos da cidade de São Paulo (SP): Escola Estadual Professor Almeida Júnior, Biblioteca Municipal Camila Cerqueira César (ambas no bairro do Butantã), a Casa de Cultura da Vila Guilherme, no bairro da Vila Guilherme, e do Centro Cultural MariAntonia da USP, em Higienópolis. Também foram realizadas entrevistas com transmissão online para amplo acesso via internet.
O projeto aconteceu em 2022, um ano chave para a cultura brasileira, tanto por questões circunstanciais quanto do ponto de vista histórico. Num horizonte mais imediato, tratava-se de pensar estratégias para retomar a visitação e uso de equipamentos públicos de cultura, como a biblioteca e os centros culturais, após um longo período de restrição de acesso por conta da pandemia da covid-19.
Na perspectiva histórica, trata-se do bicentenário da Independência e do centenário da Semana de Arte Moderna de 1922, evento articulador da história cultural do Brasil e de São Paulo. Ao longo deste século, a Semana de 22 foi muitas vezes revisitada como base para o questionamento sobre a identidade do Brasil, de seu povo e de sua cultura. Por um lado, criou-se um “mito” modernista, associado ao bandeirantismo paulista e sua “índole desbravadora”, com todas as contradições que isso implica. Por outro lado, as ideias e os problemas lançados pelos modernistas de várias regiões do país, não necessariamente ligados ao grupo paulista, continuaram a alimentar debates férteis sobre o que o Brasil foi, é e pode ser.
“Expresso 2222” é o título de um disco e de uma canção de Gilberto Gil, lançados em 1972, portanto a meio caminho entre 1922 e 2022. A canção fala de um “expresso 2222” que começou a circular, um comboio de sonho, poesia ou imaginação que parte de “Bonsucesso” pra “depois do ano 2000”. Tomamos aqui a poesia de Gil em múltiplos sentidos: buscar aquilo que se expressa entre 1922 e 2022; fazer uma conexão expressa entre os simbolismos de ambos os momentos; entender o que foi que esse “trem” percorreu nesse meio de caminho; ousar inventar alguma coisa “pra depois” de tudo isso. E assim por diante.
No Ateliê da Palavra – Expresso 22•22, aproveitamos a oportunidade para relançar o país como questão e reler um pouco dos autores envolvidos nos vários modernismos do país. Este foi um modo de convidar cada participante a pensar o seu lugar no mundo, sua relação com a própria subjetividade, com as outras pessoas, com a ideia de pertencimento coletivo e com a linguagem.
O Ateliê da Palavra procura traduzir essas propostas conceituais em vivências práticas, bastante mão na massa.
Entendemos que a leitura é uma prática criativa e todo livro, para deixar o seu silêncio e se tornar uma viva voz, precisa ser apropriado e reinventado pelo leitor. Neste sentido, o leitor é coautor de tudo o que lê. Por que então não transformar o espaço de leitura e escrita em um ateliê de criação em que o material é a palavra – do mesmo jeito que as tintas, a argila, a tela, etc. são materiais em um ateliê de artes? Assim como o educativo de um museu propõe atividades que permitem experimentar um pouco dos processos criativos dos artistas, neste projeto procuramos colocar os participantes em contato com processos de criação literária como um meio para descobrir novas formas de ler e escrever.
Em cada espaço, o Ateliê da Palavra aconteceu com um formato diferente. Na Escola Estadual Professor Almeida Júnior, houve uma turma de educadores, que realizou expedições poéticas por espaços do entorno da escola e da própria escola. Na Biblioteca Municipal Camila Cerqueira César, ocorreram encontros únicos, cada um com um público diferente, em que as propostas envolviam leituras específicas, e também expedições poéticas pelo espaço da biblioteca. Este mesmo modelo foi seguido nos encontros que aconteceram na Casa de Cultura da Vila Guilherme.
No Centro Cultural MariAntonia houve duas turmas. A primeira turma realizou expedições poéticas a lugares próximos ao MariAntonia, mas também a outros espaços de cultura da cidade, como a Vila Itororó e o MAM – onde visitamos e investigamos poeticamente a exposição “Sob as Cinzas: Brasa”, que também tinha como tema os 200 anos da Independência e os 100 anos da Semana de Arte Moderna. Com a segunda turma, que teve como foco o também centenário Pauliceia Desvairada, livro de poemas de Mário de Andrade, fizemos duas expedições poéticas ao Centro histórico da cidade de São Paulo: a primeira percorreu a rua São Bento e outras ruas do entorno; a segunda concentrou-se no Vale do Anhangabaú e no Theatro Municipal de São Paulo. Ambas expedições foram pautadas pelos escritos de Mário de Andrade.
ENTREVISTAS
Se as oficinas foram todas muito práticas, envolvendo muita leitura, atividades externas e escrita, reservamos algumas discussões teóricas, históricas e de linguagem para o espaço virtual. Em parceria com o site Outras Palavras, foram realizadas quatro entrevistas, transmitidas ao vivo e disponibilizadas permanentemente nas plataformas online. As entrevistas foram as seguintes:
Era uma vez o moderno
Entrevista com Luiz A. Bagolin e Fabrício Reiner
Transmissão ao vivo na quinta-feira, 19 de maio de 2022, às 20h.
O Modernismo como movimento cultural: o legado de Mário de Andrade
Entrevista com André Botelho e Maurício Hoelz
Transmissão ao vivo na sexta-feira, 11 de novembro de 2022, às 10h.
Ler e traduzir James Joyce
Entrevista com Henrique Piccinato Xavier
Transmissão ao vivo na quinta-feira, 17 de novembro de 2022, às 10h.
Modernismo e Regionalismo em Pernambuco
Entrevista com Eduardo Dimitrov
Transmissão ao vivo na sexta-feira, 18 de novembro de 2022, às 9h45.
Importante destacar que o projeto Ateliê da Palavra baseia-se na experiência de um projeto anterior, realizado entre janeiro e março de 2020 (quando foi interrompido por conta da pandemia da covid-19). Anexamos o link para o vídeo (com 10 minutos de duração) que apresenta como foi essa experiência anterior.
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